Entradas desiguais na compra de casa: como proteger o investimento de cada um?

Comprar casa em conjunto é um dos passos mais significativos que duas (ou mais) pessoas podem dar. Seja entre casais, amigos ou familiares, é um compromisso financeiro e emocional de longo prazo. Mas quando os contributos para a entrada não são iguais, surgem dúvidas legítimas: como garantir uma divisão justa? O que acontece se a relação terminar?

Imagine o seguinte cenário:

Duas pessoas decidem comprar uma casa juntas. Uma delas consegue disponibilizar 70% da entrada, fruto de poupanças ou apoio da família, enquanto a outra só consegue contribuir com os restantes 30%. No entanto, ambas ficam registadas como proprietárias em partes iguais. À partida, isto pode parecer justo ou simplesmente mais simples, contudo, a relação pode mudar e é por isso que é necessário entender quem tem direito a quê.

Estas situações são muito comuns, mas continuam a ser mal compreendidas. Em muitos casos, a falta de esclarecimento legal pode levar a conflitos, perdas financeiras e injustiças evitáveis. Neste artigo vamos explicar como funcionam as entradas desiguais na compra de uma casa e de que forma isso pode (ou deve) refletir-se na divisão da propriedade.

A importância de refletir a desigualdade na escritura

O primeiro passo para uma divisão justa começa logo no momento da escritura. Quando se compra uma casa em conjunto, é possível (e altamente recomendável) indicar as percentagens de cada co-proprietário. Estas percentagens podem refletir os valores investidos por cada um, incluindo a entrada inicial.

Por exemplo, se uma pessoa contribuiu com 60% do valor da entrada e a outra com 40%, pode-se formalizar essa proporção na escritura pública:

“O imóvel é adquirido por A, com uma quota de 60%, e por B, com uma quota de 40%.”

Caso nada seja indicado, a lei presume que ambos os proprietários têm partes iguais (50/50), independentemente de quem pagou mais ou menos.

⚠️ É importante salientar!

Este tipo de divisão apenas pode ser efetuado quando os compradores não são casados ou, sendo-o, estão sujeitos ao regime de separação de bens.
Nos restantes regimes matrimoniais, como o da comunhão de adquiridos, não é possível estabelecer percentagens distintas de propriedade, uma vez que o bem é considerado comum e essa diferenciação não será refletida na escritura.

No entanto, existe uma exceção importante:

Se um dos membros do casal tiver utilizado bens próprios – acumulados ou recebidos por doação ou herança antes do casamento – para a aquisição do imóvel, poderá, no momento da partilha dos bens (após o divórcio), pedir a restituição do valor investido.
Esta exceção só se aplica se for possível comprovar documentalmente a origem dos fundos e o montante utilizado.

Saiba mais
Regimes de casamento e a compra de casa com crédito: o que precisa de saber

Contrato privado: um complemento essencial

Além da escritura, pode (e deve) ser celebrado um contrato privado entre os co-proprietários, onde se detalham aspetos como:

  • Os valores já pagos por cada parte;
  • O montante que cada um se compromete a pagar no futuro (como as prestações do crédito);
  • A distribuição proporcional da propriedade;
  • Regras em caso de venda do imóvel ou separação.

Este contrato torna-se ainda mais importante nos casos em que se contrate um crédito habitação a dois (sendo casal ou não) sem estarem casados ou unidos de facto, ou mesmo na compra da casa sem qualquer financiamento. Nestas situações, não há disposições legais automáticas que protejam cada parte, o que torna essencial formalizar os contributos financeiros através de um documento com validade legal.

Pode utilizar-se uma minuta de acordo de confissão de dívida e acordo de pagamento, assinada por ambas as partes e reconhecida por notário, advogado ou solicitador. Este contrato deve identificar os montantes pagos por cada um, os valores em dívida, e as condições de pagamento.

Quando devidamente reconhecido, este tipo de documento tem validade legal e pode ser usado em tribunal, caso haja incumprimento. Assim, mesmo quando há uma relação de confiança entre as partes, um contrato como este garante proteção jurídica e a possibilidade de reaver a quantia investida em caso de litígio ou separação.

No entanto, atenção:

Essa prova só tem força total (ou seja, valor legal máximo) quando a dívida for assumida diretamente perante a pessoa que emprestou o dinheiro (o chamado “mutuante”). Isto significa que, para garantir total validade legal, quem empresta e quem recebe o dinheiro devem ambos estar identificados no documento, e a declaração deve ser feita de forma clara e direta entre essas duas partes. Caso contrário, o documento ainda pode ter valor, mas será avaliado caso a caso em tribunal – ou seja, não tem força probatória “automática”.

Empréstimos e titularidade: não são a mesma coisa

Muitas vezes, o crédito habitação é solicitado em conjunto, com ambos os nomes no contrato com o banco. No entanto, isso não determina as percentagens de propriedade. A única forma de oficializar quem detém quanto do imóvel é através da escritura.

Ser co-responsável pelo empréstimo significa ter obrigações financeiras, mas não dá automaticamente direitos proporcionais sobre a casa. Ainda assim, na ausência dessa definição, a lei considera que a propriedade é repartida por partes iguais (50% para cada), independentemente do valor investido por cada um. Assim, a definição clara na escritura salvaguarda os direitos correspondentes aos diferentes montantes investidos, o que será particularmente relevante no momento de venda do imóvel ou de eventual conflito.

Discutir percentagens de propriedade e contributos financeiros no início da compra de uma casa pode parecer desconfortável – sobretudo quando existe uma relação pessoal envolvida. No entanto, tratar estas questões de forma clara e legalmente válida é essencial para evitar mal-entendidos, proteger o investimento de cada um e garantir uma resolução justa em caso de separação, venda ou qualquer outro imprevisto.

A desigualdade nos contributos não tem de gerar conflitos, desde que exista transparência e vontade de formalizar os acordos. Seja através da escritura, de um contrato reconhecido legalmente ou de uma simples conversa franca antes de avançar com a compra, o mais importante é que cada parte saiba ao que vai, o que assume, e o que pode esperar no futuro.

Procure aconselhamento, informe-se antes de tomar decisões, e nunca tenha receio de fazer perguntas difíceis nem de lutar pelos seus direitos. Comprar casa é um passo importante — mas proteger o investimento de cada um é ainda mais essencial.
Seja qual for a relação entre os compradores, ter tudo claro desde o início é a melhor forma de garantir justiça, segurança e tranquilidade no futuro.

Está à procura de casa?
Está à procura de casa?

Encontre a sua próxima casa com a iad

Procurar
Resumo do artigo

Comprar, arrendar ou estimar o valor de um imóvel com a iad.

Com um profundo conhecimento do mercado imobiliário, os nossos consultores independentes estarão ao seu lado ao longo de todas as etapas do seu projeto.

Blog iad